Sobre o herói e o dilema do bonde

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Reprodução
É comum vermos em histórias de heróis o dilema ético que eles enfrentam quando uma pessoa amada corre perigo e eles têm a oportunidade de salvá-la, mas às custas do bem-estar de outros.

Por exemplo, uma pessoa amada pelo herói (a esposa, um filho, um parente ou um amigo próximo) corre perigo nas mãos do vilão que exige do herói algo que custará a vida de muitas outras pessoas. Ele se vê no dilema de salvar a pessoa que ele mais ama no mundo ou salvar o mundo.

Normalmente, personagens utilitaristas surgem para dissuadir o herói de pensar com o coração, uma vez que é muito mais útil salvar o maior número de pessoas possível, ainda que outras poucas a quem o herói ama sejam deixadas para morrer. Esse é o dilema do bonde.

Em ética, o dilema do bonde é um experimento mental que propõe o seguinte:

Um bonde está fora de controle em uma estrada. Em seu caminho, cinco pessoas amarradas na pista por um filósofo malvado. Felizmente, é possível apertar um botão que encaminhará o bonde para um percurso diferente, mas ali, por desgraça, se encontra outra pessoa também atada. Deveria apertar-se o botão?

Os utilitaristas, que visam o bem-estar social, responderiam que é uma obrigação moral apertar o botão uma vez que o número de pessoas salvas seria maior do que o de pessoas mortas. Mas e se a única pessoa a morrer com o desvio do bonde for alguém que o maquinista ama?

Vemos esse dilema no final do filme Caçadores de Trolls: Ascensão dos Titãs. Durante as batalhas que se sucedem, o herói, Jim Lake Jr., perde muitos amigos, inclusive seu melhor amigo Roberto Domzalski que se sacrificou para ajudar Jim a vencer a última batalha. De posse de uma pedra mágica que controla o tempo, Jim percebe que pode voltar ao passado e tentar impedir a morte dos amigos. Ele é alertado por Blink, seu mentor, de que o resultado das batalhas poderá ser o oposto do que foi e muito mais vidas poderão ser perdidas. Ao que Jim responde: “carregar fardos é o que os heróis fazem”.

Jim estava disposto a arriscar um final ainda mais trágico se isso significasse uma chance de salvar os amigos mortos. O herói não poderia garantir a segurança das pessoas que ele já havia salvado caso voltasse para tentar salvar os outros, mas mesmo assim as abandona e vai em busca daqueles que se perderam.

No capítulo 15 de Lucas vemos Jesus contar a parábola da ovelha perdida. Nela, Jesus conta que um homem, possuindo cem ovelhas e uma delas se perdendo no caminho, deixa as noventa e nove no deserto e vai em busca daquela uma que se perdeu.

Diferentemente de Jim e os heróis da cultura pop que não podem garantir o bem-estar de todos ao mesmo tempo, Jesus pode. Ele deixa as noventa e nove ovelhas em total segurança (João 10:28), apesar de estarem no deserto, e, por amar tanto a ovelha desgarrada quanto as outras, vai em busca dela.

Os heróis da cultura pop não possuem um amor sacrificial por todas as pessoas do mundo nem são onipotentes, ainda que sejam os mais poderosos de seus universos. Eles estão sujeitos às suas paixões e, por isso, normalmente, estão dispostos a arriscar a vida da maioria num acesso de amor egoísta para salvar a vida de quem eles amam. Quando muito, eles abraçam o utilitarismo e sacrificam a quem amam para salvar a maioria, mas jamais conseguem garantir a segurança de todos ao mesmo tempo.

Jesus entrega sua vida em sacrifício (João 10:11), salva a todos de modo que ninguém se perca e ainda consegue reaver sua vida (João 10:18) para desfrutar da companhia de seus amados amigos (João 15:15).

Para o caçador de trolls, o fardo de um herói são as vidas que ele não pôde salvar. Para Jesus, é o sacrifício de sua própria vida para garantir a salvação e a segurança de todos que o Pai lhe deu.

Se Jesus estivesse no bonde ele não tomaria nenhum daqueles inevitáveis destinos propostos no dilema. Ele pararia o bonde, ainda que fosse preciso se lançar nos trilhos. Jesus é o verdadeiro herói e pode garantir a salvação e a segurança de todos sem qualquer hesitação.

Você Pode Gostar Também

0 comentários

Escrever é, antes de tudo, o abstracionismo dos pensamentos, das alegrias, dos lamentos e todos os sentimentos que transpassam a alma humana. É o transbordar filosófico e poético dos mares do pensamento.

Debruce os sentimentos de sua alma sobre este espaço, caro leitor.

Todos os Direitos Reservados

Seguidores